As transformações do sistema financeiro, no momento histórico atual, também chamado de 4ª Revolução Industrial, foram amplamente debatidas na Conferência sobre a Reestruturação do Setor Bancário, organizada pela UNI Finanças Mundial, em Dublin, Irlanda, na terça e quarta-feira (13 e 14).
O tema foi objeto de uma pesquisa da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound), apresentada no evento pelo economista Raymond Torres, analista internacional da Funcas, um conceituado think tank (laboratório de ideias) espanhol dedicado à pesquisa socioeconômica, e que também já atuou na Organização Internacional do Trabalho (OIT) e na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O estudo tem como objetivo a compreensão das causas da crise que afeta muitos países no atual momento histórico. A apresentação de Torres, bem como as intervenções dos participantes, abordou a capacidade de destruição das condições sociais que as crises econômicas apresentam, em uma velocidade muito grande, bem como a recuperação posterior, que é assimétrica, dramática e muito mais lenta.
A pesquisa havia sido apresentada inicialmente em um evento da UNI Finanças Américas, em Montevidéu, no início de setembro (neste link, reportagem no site da UNI Global Union, em inglês). A UNI Finanças também publicou o sumário da pesquisa, em português de Portugal.
Impacto da digitalização – Para a presidenta da UNI Finanças Mundial e secretária de Relações Internacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Rita Berlofa, que participou do evento, “este debate mostrou que o impacto da digitalização no setor bancário mostra no mundo todo resultados nada diferentes daquilo que já conhecemos no Brasil, com consequências graves à categoria bancária, com demissões e fechamento de agências”.
No Brasil e em outros países latino-americanos, no entanto, esse processo tem sido ainda mais traumático do que em regiões como a Europa, pois lá “a grande maioria dos desligamentos se dá por demissão voluntária ou por antecipação de aposentadoria”, explicou Rita Berlofa.
Durante os debates, foi enfatizada a importância de esse tema ser pautado pela classe trabalhadora, pois essa é uma oportunidade de se discutir quais tipos de trabalho estão sendo gerados pela digitalização do setor, qual a sua qualidade e quais leis estão sendo elaboradas a respeito, por exemplo.
Nesse aspecto, a chamada revolução tecnológica foi abordada como um processo não neutro, e que, portanto, precisa ser moldado com visão social para abranger mudanças como o teletrabalho e atender demandas de equidade de gênero, por exemplo.
“Em uma discussão como esta, sob a ótica da classe trabalhadora, passamos a buscar soluções para as novas faces da empregabilidade, que trazem desafios para as organizações sindicais de todo o mundo, a respeito da qualidade do trabalho e das próprias estratégias de atuação do movimento nesse novo cenário de constantes transformações”, afirmou Rita.
Geopolítica – O sistema financeiro também foi abordado sob a perspectiva geopolítica, considerando tanto temas políticos, como o crescimento da China no xadrez mundial, quanto tópicos específicos, como as mudanças climáticas, a inflação, o encarecimento dos alimentos e minérios e o limite da energia baseada em petróleo e gás, que impactam o setor financeiro e a economia mundial.
O posicionamento da classe trabalhadora a respeito dessas preocupações foi apresentado como fundamental para a luta por seus direitos em âmbito mundial. “Entendemos, em especial a partir da apresentação de Raymond Torres, que, mais do que nunca, o setor financeiro deve investir em estudos e implementação de tecnologias de energias limpas, como também se desfazer de ativos que não sejam provenientes das chamadas finanças verdes”, resumiu a presidenta da UNI Finanças.
Bancos públicos – O foco na transição verde como caminho para a defesa do planeta, direcionou o debate para o real papel dos bancos na redução da pobreza global. “Torres chamou a atenção para a necessidade de o setor financeiro investir com objetivo de redução das desigualdades, porque com todos esses fatos, aponta-se para o encarecimento da comida e a diminuição de postos de trabalho, o que tende a aumentar a pobreza no mundo”, disse Rita Berlofa.
Conforme a secretária da Contraf-CUT, “muitos debatedores observaram que devemos aprofundar a discussão sobre se todos os bancos devem ser públicos, considerado que seu papel também deve ser voltado para a sobrevivência do planeta, para a redução da desigualdade e da pobreza”. Rita Berlofa afirmou que todos entendem que esse debate tem um longo caminho a percorrer, “mas nosso papel é entender que o banco é um serviço público, que como tal deve ter pensado e assim deve ser cobrado dos governos”.
UNI Finanças – A UNI Finanças Mundial é um braço temático da UNI Global Union, que representa cerca de 20 milhões de trabalhadores em 150 países, nos setores de finanças, meios e entretenimento, esportes, cuidados, limpeza, segurança, comércio, cassinos, serviços postais, gráfica e embalagem e telecomunicações.
Após a conferência, haverá a reunião do presidium da UNI Finanças Mundial, em que participam a presidenta global, Rita Berlofa, e os presidentes regionais (Américas, Ásia & Pacífico, África e Europa). Em seguida, uma reunião da direção executiva definirá as diretrizes da UNI Finanças para o próximo período de atuação.