Negros são maioria da população, mas minoria no mercado de trabalho

21/03/2017 – 15:22

No Dia Internacional Contra a Discriminação Racial, SindBan promoveu Café da Manhã para discutir o assunto

“;O racismo deu certo no Brasil “;. A fala do jornalista e historiador, Ivan Galvão, abriu a roda de conversa que aconteceu na manhã desta terça-feira (21), na sede do SindBan (Sindicato dos Bancários de Piracicaba e Região), para refletir sobre o Dia Internacional Contra a Discriminação Racial. Por cerca de 2 horas, dirigentes sindicais, autoridades e militantes debateram sobre o preconceito, inserção do negro no mercado de trabalho, pol íticas públicas para o empoderamento da mulher e a autoestima das crianças negras.

Apesar de representarem 54% do pa ís, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat ística), os negros não são vistos no mercado financeiro. A pesquisa ‘Perfil Bancário’, realizada pelo SindBan, apontou que apenas 3,80% da categoria é composta por homens e mulheres negras. Para o presidente do SindBan, José Antonio Fernandes Paiva, é essencial que esse mapeamento seja realizado em outras esferas trabalhistas. “;Para lutarmos pela inserção do negro no mercado de trabalho, precisamos mostrar, com dados, que em algumas categorias a porcentagem é irrisória. Deixo como tarefa para outros sindicatos, para que façam essa pesquisa “;, comentou o sindicalista.

Segundo o advogado José Silvestre, é necessário mostrar para as crianças negras da periferia que existem exemplos de pessoas negras ocupando cargos importantes. “;O poder judiciário do Brasil é branco, você não vê negros advogados. Na saúde, você não vê negros médicos. A criança negra da periferia acha que a única opção que ela tem, que é a que ela conhece, é ser traficante. Quando você insere negros no alto escalão, você espelha meninos e meninas negras de todo o pa ís “;, comentou.

Para as mulheres negras a dificuldade de inserção no mercado de trabalho é ainda maior. Apenas 31,3% das mulheres negras ocupadas com 16 anos ou mais, em 2014, possu íam carteira assinada, segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domic ílios (PNAD) de 2014. Em Piracicaba e Região, por exemplo, das 752 mulheres entrevistadas pelo Perfil Bancário, apenas 12 se declararam negras. Para o presidente do Conepir (Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra de Piracicaba) e membro do Inspir (Instituto Sindical Interamericano Pela Igualdade Racial), Adney Araújo, as mulheres negras se fortalecem academicamente para se manter em seus cargos. “;As mulheres negras fazem faculdade, pós, doutorado, apenas para se manterem em seus cargos, já que o mercado de trabalho não deixa elas se igualarem ou superarem “;, comentou.

Araújo comentou, também, que o crime de racismo é o 2º mais cometido na internet, perdendo apenas para a pedofilia “;Nós, negros, já estamos em tantas estat ísticas ruins, socialmente falando. Somos os que mais morremos, os que menos tem inserção no mercado de trabalho, os que mais estão nas favelas, na internet não poderia ser diferente. Precisamos acabar com a cultura de que a internet é ‘terra de ninguém’, racismo é crime e precisa ser denunciado “;, explicou.

Dia Internacional Contra a Discriminação Racial

Em 21 de março de 1960, 69 estudantes africanos foram mortos e 186 ficaram feridos na cidade de Shaperville durante um protesto contra o regime do Apartheid. A multidão foi oprimida pela pol ícia do regime, que abriu fogo sobre as pessoas, que estavam desarmadas. Em memória ao massacre, a ONU (Organização das Nações Unidas) instituiu a data como reflexão sobre a luta contra o racismo.

Fatos da luta dos negros contra o racismo e a discriminação racial:

1452: Portugueses negociam o primeiro acordo de comércio de escravos africanos.

1503: Espanhóis e portugueses começam a trazer escravos africanos para o Caribe e América Central para substituir os nativos americanos nas minas de ouro.

1694: No Brasil, o quilombo de Palmares (PE), um dos maiores locais de refúgio dos escravos africanos, que chegou a ter mais de 20 mil pessoas, segundo os pesquisadores, é invadido e destru ído. Seu l íder, Zumbi, foge, mas é capturado e decapitado no ano seguinte, em 20 de novembro.

1810: A Inglaterra declara ilegal o tráfico negreiro e o pr íncipe regente Dom João VI se compromete a estabelecer a abolição gradual da prática.

1831: A Lei Feijó, que pro íbe o tráfico negreiro, apesar de aprovada, é descumprida. Anos mais tarde, em 1850, a Lei Eusébio de Queiroz reforça a proibição.

1834: A Inglaterra promove a abolição do trabalho escravo em suas colônias.

1871: O Brasil aprova a Lei do Ventre Livre, que estabelece que filhos de escravos nascidos a partir daquela data seriam considerados livres ao completarem 8 anos.

1885: Em mais uma tentativa de abolir gradualmente a escravidão, é aprovada a lei que liberta escravos de mais de 65 anos, mediante indenização. Os proprietários, porém, passam a alterar os registros para burlar a idade de seus escravos.

1888: Após várias revoltas de negros pelo pa ís, a princesa Isabel, com a aprovação pelo Parlamento, assina a Lei áurea, abolindo a escravatura no Brasil.

1910: A resistência dos trabalhadores negros contra a exploração e a mentalidade escravocrata da marinha brasileira culmina com a Revolta da Chibata, no Rio de Janeiro.

1931: José Correia Leite, Arlindo Veiga dos Santos, Francisco Lucrécio e Raul Joviano do Amaral lideram a Frente Negra Brasileira, um movimento de repercussão nacional, de mobilização popular que saiu de São Paulo e atingiu vários estados do pa ís. (V ídeo: Acervo Cultne)

1934: Livres, mas sendo considerados cidadãos de segunda classe, os negros só conseguiram conquistar o direito ao voto.

1944: O Teatro Experimental do Negro (TEN) foi idealizado, fundado e dirigido por Abdias Nascimento, com o objetivo de valorizar o negro e sua cultura por meio do teatro, englobando cidadania e conscientização racial. O projeto revelaria mais tarde talentos como Ruth de Souza, Jacyra Sampaio, Léa Garcia e Aguinaldo Camargo.

1945: A Convenção Nacional do Negro Brasileiro reuniu propostas da comunidade negra para a Constituinte de 1946, entre elas a formulação de uma lei anti-discriminatória.

1951: é aprovada a Lei Afonso Arinos, que estabelece a pena de um ano de prisão ou multa por racismo. Em 1989, a prática passa a ser considerada como crime inafiançável pela Lei Caó.

1954: é publicado o livro “;Preconceito racial de marca e preconceito racial de origem “;, de Oracy Nogueira, parte do projeto de pesquisa da UNESCO sobre relações raciais no Brasil, acirrando os debates em torno do tema. No ano seguinte, é publicado “;Negros e Brancos em São Paulo “;.

1955: A prisão da costureira negra Rosa Parks nos Estados Unidos causou indignação aos defensores dos direitos humanos em todo o mundo e teve grande repercussão entre os grupos de negros no Brasil. Rosa foi presa na cidade de Montgomery, no Alabama, após se negar ceder o lugar onde estava no ônibus a um homem branco, violando a lei que mantinha a segregação racial no transporte público.

1960: Pobre e negra, a escritora Carolina Maria de Jesus lança o livro Quarto de Despejo: diário de uma favelada, em São Paulo. Com descrições comuns do cotidiano, como acordar, buscar água, fazer o café e narrativas fortes que desvendavam a vida de uma mulher negra da periferia, a obra teve grande repercussão. Após o lançamento, seguiram-se três edições, com um total de 100 mil exemplares vendidos, tradução para 13 idiomas e vendas em mais de 40 pa íses.

1964: No Brasil, a publicação do livro “;A integração do Negro na Sociedade de Classes “;, do sociólogo Florestan Fernandes coloca a tão propagada democracia racial brasileira como um mito. A obra tem grande repercussão e é considerada um marco na sociologia brasileira.

1965: Malcolm X, um dos defensores do Nacionalismo Negro nos Estados Unidos, é assassinado enquanto discursava no Harlem, um dos bairros negros de Nova Iorque. Ao contrário de Martin Luther King, que apostava em uma resistência pac ífica contra o racismo, Malcolm defendeu inicialmente a separação das raças e a criação de um Estado autônomo para os negros sob as bençãos do Islã. Tempos depois, após uma viagem à Meca, adotou um tom mais conciliatório que desagradou seus seguidores. Foi morto com 13 tiros, ao lado de sua mulher Betty, que estava grávida, e de suas quatro filhas, por um militante do movimento negro.

1966: A Organização das Nações Unidas (ONU) institui o 21 de março como Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial em referência ao Massacre de Sharpeville, ocorrido seis anos antes.

1968: O Brasil assina a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1965.

Famoso pela luta pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos através da não violência, o pastor Martin Luther King Jr. foi assassinado em 4 de abril, na varanda do hotel onde estava hospedado em Memphis, no estado do Tennessee. Sua morte repercutiu internacionalmente e até hoje ele é tido como inspiração para ativistas negros em todo o mundo.

1969: Durante a ditadura militar, a Lei de Segurança Nacional de 11/03/1967 colocava como crime contra a segurança do Estado Brasileiro incitar publicamente ao ódio ou à discriminação racial incluindo veiculação na imprensa, panfletos radiodifusão ou televisão. A medida, no entanto, reforçou a repressão sobre os ativistas do movimento negro, que eram acusados de fazer propaganda “;marxista “; e incentivar conflitos raciais.

é fundado o Centro de Estudos Africanos da Universidade de São Paulo (USP). Sob a direção de Clovis Moura, o centro organizava palestras e pesquisas acadêmicas em conjunto com Florestan Fernandes sobre a temática do negro brasileiro. Tinha suas atividades monitoradas pelo DEOPS – SP.

O ator Zózimo Bulbul é o primeiro negro a protagonizar uma telenovela. Também é o primeiro negro a ser modelo de uma grife de alta-costura no Brasil.

1974: Com o objetivo de valorizar a cultura afrobrasileira, é criado o bloco O Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil, em Salvador, na Bahia.

1978: Os 90 anos da Abolição são marcados por inúmeras manifestações de protesto, mesmo durante o Regime Militar. O Núcleo Negro Socialista participa da formação do Movimento Unificado Contra a Discriminação Racial (MUCDR), com protestos nas ruas contra a Ditadura Militar, o mito da democracia racial e a violência policial. Ainda neste ano, o MUCDR lança o Manifesto Nacional da Consciência Negra.

1979: O presidente Ernesto Geisel restabelece o pluripartidarismo e formaliza a abertura pol ítica com a Lei Federal n° 6.767/79.

1980: O Censo Demográfico Brasileiro volta a coletar informações sobre cor e raça após protestos dos ativistas e intelectuais contra a pol ítica de branqueamento da população: branco (54,77%), preto (5,87%), pardo (38,45%) e amarela (0,63%).

1985: A Lei Caó (Lei nº 7437/85) classifica o racismo e o impedimento de acesso a serviços diversos por motivo de raça, cor, sexo, ou estado civil como crime inafiançável, pun ível com prisão de até cinco anos e multa.

1986: Durante a Convenção Nacional do Negro, realizada em Bras ília, o movimento negro faz propostas à Constituinte, como a criação de um tribunal especial para o julgamento dos crimes de discriminação racial.

1988: A Constituição Federal garante às comunidades remanescentes de quilombos a propriedade das terras ocupadas por elas.

1989: Promulgada em 5 de janeiro de 1989, a Lei Caó (Lei n° 7716/79) inovou ao caracterizar a prática de racismo como crime pass ível a pena de reclusão de dois a cinco anos. Anteriormente, a Lei Afonso Arinos (Lei 1390/51) tratava a questão apenas como contravenção penal.

1988: No Centenário da Abolição, várias manifestações ocorrem pelo pa ís. No Rio de Janeiro, a Marcha contra a Farsa da Abolição reúne cerca de 5 mil pessoas, enfrentando a repressão do Exército. Ainda neste ano, é realizado o I Encontro Nacional de Mulheres Negras e o governo federal cria a Fundação Cultural Palmares,  voltada para promoção e preservação da arte e da cultura afro-brasileira.

1990: Em 11 de fevereiro de 1990, Nelson Mandela foi libertado, após passar 28 anos na prisão pelo seu engajamento contra o apartheid racial na áfrica do Sul.

1992: é realizado o I Encontro de Mulheres Afro- Latino-Americanas e Afro-Caribenha em Santo Domingo/República Dominicana. Nesse encontro foi institu ído o Dia da Mulher Negra Latinoamericana e Caribenha.

1999: é criada a Frente Parlamentar em Defesa da Igualdade Racial no Congresso Nacional.

2000: é fundado o Fórum Nacional de Mulheres Negras, que reivindica a elaboração e a efetivação das pol íticas públicas para mulheres negras. Também neste ano, é criada a Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), com o objetivo de congregar os pesquisadores negros e promover conferências, reuniões, cursos e debates no interesse da pesquisa sobre temas de interesse direto das populações negras no Brasil.

2002: A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) é a primeira universidade a ter cotas raciais. Como ação afirmativa para a população negra, são reservadas 50% das vagas para candidatos oriundos da rede pública de ensino e 40% para candidatos que se declaram pretos(as) ou pardos(as).

2003: A Lei 10639/2003 altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9394/1996) para incluir o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana no curr ículo oficial da rede pública e privada de ensino.

2005: Cerca de 100 mil pessoas participam da I Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CONAPIR) em Bras ília. A conferência aponta propostas para a elaboração do Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial e étnico.

2007: é realizado o Encontro Nacional da Juventude Negra (ENJUNE), na Bahia. Cerca de 800 pessoas entre delegados, coordenadores e convidados compareceram ao evento nacional para levar as contribuições da juventude negra debatidas nos encontros estaduais.

2008: é fundada a Comissão Nacional de Jornalistas pela Igualdade Racial (CONAJIRA), com o objetivo de apoiar os jornalistas negros e combater a discriminação racial na m ídia.

Estatuto da Igualdade Racial é tido como um grande marco na luta contra o racismo e a desigualdade étnico-racial no Brasil. Imagem: IRDEB

2010: é promulgado o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010), que garante à população negra a efetivação igualdade de oportunidade e dos direitos étnicos individuais e coletivos e o combate à discriminação e às formas de intolerância étnica.

2012: é promulgada a Lei de Cotas (Lei nº 12.711), que garante que até 2016 seja feita a reserva de 50% das matr ículas por curso e turno nas 59 universidades federais e 38 institutos federais de educação a alunos oriundos do Ensino Médio Público. Os demais 50% das vagas permanecem para ampla concorrência. Das vagas reservadas para a escola pública, metade será destinada para estudantes com renda mensal familiar até um salário m ínimo e meio e para estudantes autodeclarados negros ou pardos ou ind ígenas, de acordo com o percentual desta população na localidade, seguindo dados estat ísticos do IBGE.

Universidades federais devem alcançar meta de oferta de metade das vagas para alunos de escolas públicas. Medida favorece o acesso de estudantes de baixa renda, negros, ind ígenas ao ensino superior público.

2016: Universidades e instituições federais de ensino devem cumprir a meta de oferecer 50% das vagas universitárias para estudantes de escolas públicas, institu ída pela Lei de Cotas. Dessas vagas reservadas às cotas, metade são para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a um salário m ínimo e meio per capita e metade para estudantes de escolas públicas com renda familiar superior a um salário m ínimo e meio. Em ambos os casos, também é considerado para a oferta de vagas o percentual m ínimo correspondente ao da soma de pretos, pardos e ind ígenas no estado, de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat ística (IBGE).

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