O Banco Central (BC) divulgará nos próximos dias regras, valores e cronograma de implementação do acordo de Basileia 3. Ontem (27), o ministro da Fazenda, Guido Mantega, convocou dirigentes dos oito maiores bancos estatais e privados do pa ís para discutir o crescimento da oferta de crédito neste ano – que foi muito modesta nos bancos privados – e pediu maior engajamento do sistema para financiar o crescimento em 2013.
Basileia 3 foi parte do assunto da reunião, mas, sobre isso, não foi dito nada de conclusivo. As preocupações, no governo, são distintas. A Fazenda teme que o cumprimento das novas exigências de capitalização e provisionamento do acordo, a partir de 2013, prejudique o frágil crescimento do crédito e, por consequência, o próprio crescimento econômico. Ao BC interessa a solidez do sistema e uma expansão moderada do crédito.
Os Estados Unidos e vários pa íses europeus anunciaram o adiamento dos prazos para o cumprimento das novas regras. Já o Japão, a China e a Austrália divulgaram que vão seguir o cronograma original. Essas são decisões que refletem o grau de dificuldade que os bancos estão enfrentando no pós-crise.
Na avaliação das autoridades, o sistema bancário brasileiro “é uma fortaleza e está preparado para cumprir o cronograma do acordo de Basileia 3”. A regulação no pa ís, hoje, já é mais rigorosa do que no resto do mundo e, nas contas da autoridade monetária, a tendência é que o impacto das novas normas seja praticamente “neutro” sobre a pol ítica de crédito dos bancos.
Foi essa a mensagem que o presidente do BC, Alexandre Tombini, passou a banqueiros durante jantar de confraternização na Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), antes do Natal. “Esse acordo representa um importante avanço na regulação prudencial internacional. Amplia a segurança e reduz espaços para arbitragens regulatórias. Endereça as principais lições da crise financeira global de 2008”, disse, acrescentando: “Estamos seguros de que a adoção no Brasil se fará sem perturbações. E que o esforço de adequação está dentro das possibilidades do nosso sistema. Aliás, já partimos de um patamar diferenciado, em termos de capital, regras de provisionamento ou monitoramento de liquidez, por meio de métricas que agora começam a ser adotadas como referência global”.
Ao fim do discurso, concluiu: “Adotaremos um cronograma de implantação adequado. As instituições financeiras terão previsibilidade e prazo de adaptação. Com isso, a adoção de Basileia 3 ocorrerá de forma natural no pa ís”.
O BC entende que os bancos que operam no Brasil terão, em geral, condições de atender às novas exigências de capital com a retenção de lucros e respeito às normas de distribuição de dividendos e bonificações, sem necessariamente ter que buscar recursos no mercado.
Basileia 3 foi resultado de um longo debate, no âmbito do BIS (Banco de Compensação Internacional), sobre a reformulação da regulação do sistema financeiro que se seguiu à crise de 2007/2008. O BC se posicionou sempre ao lado dos pa íses que advogaram medidas mais restritivas e o fez olhando para o processo de internacionalização dos bancos brasileiros, para evitar que eles importem riscos.
Embora bem capitalizados, os bancos nacionais possuem capital cuja qualidade não é das melhores. Por Basileia 3, eles terão, entre 2013 e 2019, que aumentar o capital de alta qualidade (capital principal), criar colchões para o enfrentamento de crises financeiras, ter ativos l íquidos realizáveis para atender à demanda em situações de crise e requerimento de capital m ínimo para alavancagem.
Nas últimas semanas, a Febraban preparou estudos sobre os prováveis efeitos das novas obrigações e seus impactos sobre a oferta de crédito e sobre o crescimento do pa ís. Chegou a estimar em 2% a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) o eventual impacto sobre o crédito no pa ís, ao longo do per íodo de aplicação das novas exigências.
Outra questão importante refere-se aos bancos públicos federais. Com as novas exigências de capital de boa qualidade, o governo deverá ter que aportar mais recursos no capital de suas instituições (Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste).
Ainda não foi comunicada uma solução para a enorme diferença de tratamento que o BC e a Receita Federal dão para o crédito tributário, algo que será gradualmente retirado da composição do patrimônio de referência dos bancos. O Fisco é mais rigoroso que o BC na contabilização dos créditos de credores duvidosos para efeito de provisionamento. E só permite seu reconhecimento após esgotados todos os processos administrativos e judiciais de cobrança – o que, em geral, chega demorar um ano. Isso gera uma antecipação de receita para a União e um crédito para o sistema financeiro da ordem de R$ 60 bilhões. Os dirigentes da Febraban advogam a aproximação dos critérios da Receita Federal aos da autoridade monetária, que considera como inadimplência créditos devidos e não pagos em um prazo de 90 dias.
O crescimento do crédito, um dos principais motores da atividade econômica até 2010, foi modesto em 2012, sobretudo nos bancos privados que operaram com enorme cautela depois de amargar aumento da inadimplência. Ao contrário dos bancos públicos, que pisaram no acelerador, os privados apresentaram expansão módica do crédito – em torno de 3%.
Na reunião de ontem, o ministro Guido Mantega passou aos banqueiros mensagem de otimismo para o próximo ano e pediu empenho na liberação de crédito. Segundo ele, o cenário de retomada da economia com redução da inadimplência, associado a uma situação internacional um pouco mais favorável, o faz acreditar que a concessão de crédito pelas instituições privadas deve ter desempenho melhor em 2013.
Participaram da reunião Roberto Setubal (Itaú), Luiz Carlos Trabuco (Bradesco), Jorge Hereda (Caixa), Paulo Caffarelli (BB), S ílvio de Carvalho (Safra), Marco Araújo (Santander), Hélio Ribeiro (HSBC) e Pedro Lorenzini (Citibank).
Fonte: Valor Econômico