A presidenta da Sabesp, Dilma Penna, não admite o racionamento de água e alega que o desabastecimento é pontual, incidindo em alguns locais mais elevados e em áreas muito afastadas dos reservatórios. Penna fez essas afirmações na quarta-feira, 15. No entanto, 70 cidades onde vivem 13,8 milhões de pessoas estão sem água. Desses, 38 já adotaram o racionamento, três estão em situação de emergência e uma em calamidade pública.
O problema, no entanto, é mais amplo, e a culpa jogada na ausência de chuvas tem origem, na verdade, na falta de investimentos e na privatização da Sabesp. A avaliação é do geólogo Delmar Mattes, um dos maiores estudiosos do assunto.
A Sabesp é uma empresa de capital misto. O governo estadual detém 51% das suas ações e os outros 49% estão divididos entre acionistas. O estatuto social estabelece que eles podem receber 25% do lucro l íquido anual da empresa (payout). No entanto, nos governos de Geraldo Alckmin (PSDB) os donos das ações receberam muito mais.
Em 2003, por exemplo, 60,5% do lucro l íquido da Sabesp foram parar nas mãos de acionistas. Do resultado de R$ 1,923 bilhão em 2013, R$ 534,2 milhões foram distribu ídos aos acionistas. Os dados são do relatório da diretoria econômico-financeira e de relações com investidores da Sabesp, e datam de março de 2014.
“;A Sabesp aplicou uma pol ítica de mercantilização da água lançando ações nas bolsas de Nova York (foto abaixo) e de São Paulo e se preocupou muito mais em obter lucratividade para atender os acionistas do que investir na captação, distribuição e universalização da água, que é um bem essencial para a população “;, afirma Delmar Mattes.
SEM PLANEJAMENTO -; A falta de planejamento é outro fator responsável pelo desabastecimento. A Sabesp recebeu autorização para explorar a distribuição de água ainda em 1974. E para que pudesse ser renovada, em 2004 a Agência Nacional de águas (ANA) e o Departamento de águas e Energia Elétrica (DAEE) fizeram uma série de exigências, dentre elas, que a estatal elaborasse um plano de contingência para ações durante situações de emergência.
A empresa também deveria providenciar, no prazo de até 30 meses, estudos e projetos que viabilizassem a redução de sua dependência do Sistema Cantareira. Essas determinações nunca foram colocadas em prática.
“;Enquanto o consumo estava aumentando, a produção de água não acompanhou esse crescimento, então era fácil de se calcular que sem investimento iria faltar água. Por que a crise não aconteceu antes? Porque t ínhamos per íodos de chuvas intensas, e isso mascarava a falta de planejamento e investimento “;, explica o geólogo.
DESPERD íCIOS -; De acordo com relatório da Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp), oíndice de perdas no sistema de abastecimento aumentou de 2011 para 2012. A Sabesp desperdiça cerca de 32% de toda a água captada nos mananciais. Somente no ano passado foram perdidos 924,8 bilhões de litros, o que equivale à capacidade máxima do Sistema Cantareira. Esses números motivaram a abertura de inquérito pela Promotoria do Patrimônio Público e Social de São Paulo.
Segundo o vereador Nabil Bonduki (PT), dados trazidos pela presidente da Sabesp durante a CPI instaurada pela Câmara Municipal apontam a gravidade da situação e a incapacidade do governo estadual em lidar com a crise.
“;A Sabesp reduziu apenas 5% do total do consumo desde o in ício do ano, e 25% dos consumidores, ou seja, um em cada quatro aumentou o consumo durante o mesmo per íodo “;, disse. “;Isso porque o governo do Estado deu um bônus para quem reduziu o consumo, mas não estabeleceu nenhuma penalidade para quem o mantivesse ou ampliasse “;, afirmou.
Diante disso tudo, o n ível do Sistema Cantareira, que abastece 6,5 milhões de pessoas na Grande São Paulo, registrou na quarta 15 o menoríndice de sua história (5,5%, da capacidade). No mesmo per íodo do ano passado, a capacidade girava em torno de 40%.
Agora, a Sabesp quer usar a segunda cota do volume morto -; água que fica no fundo das represas. A primeira parte dessa reserva começou a ser captada em 15 de maio deste ano e já está acabando.
O Ministério Público de São Paulo e o Ministério Público Federal entraram na Justiça para impedir. Segundo Delmar, com a utilização dessa reserva, os reservatórios podem nunca mais se recuperar.
“;O bombeamento desse volume morto tem que ser interrompido, porque se não chover, nós teremos uma crise que não se pode nem imaginar Com essa proibição, estão querendo pressionar a Sabesp para que assuma o racionamento. Isso não foi feito antes da campanha para não prejudicar a reeleição ao Alckmin”, afirma Mattes.
Fonte: SP Bancários
Chuvas mascararam crise hídrica por anos
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